segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O REGRESSO À TERRA

Quando os milhões de Bruxelas chegavam às carradas, Portugal vivia numa euforia colectiva. Havia cursos para todos os gostos e feitios, financiados pela União Europeia, a bolsa criava novos-ricos a cada instante e aqueles que beneficiavam com essas regras do jogo faziam questão de ostentar o seu sucesso. A avenida 24 de Julho em Lisboa, por exemplo, em quase todas as noites da semana fazia lembrar um estádio de futebol esgotado. Nesse período, muitos citadinos lançaram a moda de comprar montes alentejanos, pois sentiam-se sufocados com a agitação das cidades. Alguns apenas procuravam um refúgio de fim-de-semana, outros instalavam-se de armas e bagagens com a ajuda das novas tecnologias. Estava a viver-se o início da globalização e os faxes que até então pareciam um instrumento de trabalho muito avançado começavam a ficar para trás, quase como objectos de museu. Alguns anos antes, no início da década dos anos 80, um bispo tinha sobressaído para falar em fome no concelho de Setúbal. Mas em pleno cavaquismo ninguém queria saber do passado. As empresas que tinham lucros impensáveis começaram a exigir aos seus quadros ainda mais lucros. Empresas que facturavam milhões acabavam por despedir funcionários para conseguirem ainda mais lucro. Quantas empresas de consultadoria não surgiram nesse período, anunciando receitas mágicas para mais riqueza? Muitas, seguramente.
Com a actual crise, as palavras desemprego e fome voltaram a estar na ordem do dia. Milhares de pessoas não têm emprego e são obrigadas a recorrer à caridade para darem de comer aos filhos. No campo e nos tais montes, a vida corre a outro ritmo. Um pequeno terreno dá para cultivar algo que se ponha na mesa e as despesas são muito inferiores às das grandes cidades. Nos centros urbanos, filhos voltam a casa dos pais ou juntam-se com amigos para dividirem despesas de habitação e transportes. Mas acredito que muito boa gente não terá outra alternativa que não seja sair da cidade e ir procurar na terra uma forma de vida diferente. à semelhança daqueles emigrantes que voltaram para casa, sem terem conseguido ganhar o suficiente para construírem o seu “chalé”. Em tempo de crise resta sobretudo a solidariedade.

Vitor Rainho

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